Reportagens

Boipeba aguarda posição do governo Lula sobre terras alvo de megaprojeto 4u1o3j

Novo prazo para manifestação acaba na quarta-feira (4). A empreitada é planejada por um time de grandes empresários

Aldem Bourscheit ·
2 de outubro de 2023 · 2 anos atrás

Meio ambiente e populações tradicionais na ilha baiana de Boipeba aguardam uma manifestação definitiva do governo Lula sobre o possível uso de terras da União por um megaprojeto turístico-imobiliário privado autorizado pelo governo estadual. ((o))eco acompanha o caso desde 2019.

Na quarta-feira (4), acaba o novo prazo de 90 dias para que a Secretaria do Patrimônio da União (SPU) se posicione sobre “irregularidades identificadas no processo istrativo” envolvendo o aproveitamento de parte da ilha pelo empreendimento Ponta dos Castelhanos.

A suspensão começou em abril e foi renovada em julho. Desde então, estão proibidas obras no imóvel de 1.651 ha, quase 20% da área de Boipeba. A ilha é uma das porções mais preservadas da Mata Atlântica brasileira e abrigo de quilombolas e extrativistas. 

As medidas federais pesaram documentos, informações de moradores da ilha, entidades civis, Governo Estadual, Prefeitura de Cairu – onde está Boipeba e outras ilhas – e da Mangaba Cultivo de Coco, grupo de empresários à frente do projeto, com pousadas, residências, pista de pouso e infraestrutura náutica. 

O deputado estadual Hilton Coelho (PSOL-BA) avalia que os adiamentos  permitiram a residentes da ilha e movimentos sociais se informar mais e melhor sobre os impactos do licenciamento, assinado em março pelo Instituto do Meio Ambiente e Recursos Hídricos da Bahia (Inema).

“Os embargos estão em sintonia com as comunidades tradicionais da região. Elas não querem que a autorização ao projeto seja validada, mas sim que seus direitos sejam respeitados, como a titulação de seus territórios ancestrais”, destaca o parlamentar. 

O PSOL rompeu este mês com o governo Jerônimo Rodrigues (PT), que apoiava desde o pleito de 2022. Os embates incluem a violência na segurança pública e o descaso com o meio ambiente. A sigla segue na base do governo Lula, que mantém promessas de amplo respeito às questões ambientais.

Jerônimo Rodrigues é o quinto governador petista da Bahia. Foto: Adriel Francisco / Creative Commons.

Imbróglio fundiário 274a5s

Em julho, a SPU afirmou a ((o)eco que, de forma preliminar, “identificou incompatibilidade do empreendimento com o instrumento de inscrição de ocupação, haja vista a previsão de parcelamento da área, o que não exclui, por ora, a possibilidade de concessão de outro instrumento definitivo aos atuais ocupantes, observados os direitos das comunidades tradicionais”.

A declaração ampliou expectativas sobre a legalidade do Ponta dos Castelhanos frente ao regramento federal. Ilhas sem sedes municipais, como Boipeba, são completamente terras da União e deveriam ser destinadas sobretudo a usos tradicionais, diz o Ministério Público Federal (MPF). 

Além disso, a vegetação de Mata Atlântica em estágio médio ou avançado de regeneração não poderia ser derrubada para iniciativas particulares, apenas para obras licenciadas e de comprovada utilidade pública ou interesse social.

A inscrição das terras alvo do Ponta dos Castelhanos foi reada à empresa no governo de Jair Bolsonaro, em abril de 2022. Antes, o terreno foi comprado de um empresário acusado de apropriação de terras públicas.

“Não há autenticidade nos documentos apresentados [para a negociação e uso das terras]. A SPU não pode fazer uma possível ‘lavagem’ de terras griladas aprovando de vez o projeto”, reclama Hilton Coelho (PSOL-BA).

Por meio da Lei de o à Informação, a SPU confirma que “não houve ree de terras da União à referida empresa, mas sim transferência do instrumento de inscrição de ocupação, outorgado inicialmente em favor de outra pessoa”. 

A autarquia lembra que um decreto federal de 1977 define que tal inscrição, “ressalvados os casos de preferência ao aforamento, terá sempre caráter precário, não gerando, para o ocupante, quaisquer direitos sobre o terreno ou a indenização por benfeitorias realizadas”. 

O imbróglio fundiário gerou repetidos pedidos do Ministério Público Federal e da Defensoria Pública da União para que o Governo da Bahia cancelasse de vez a licença do projeto, ainda sem efeito.

“Se a SPU atropelar essas recomendações imporá uma forte desvalorização ao governo federal e poderá ensejar uma grande e longa batalha judicial”, avalia o deputado estadual Hilton Coelho (PSOL-BA). Em junho, a Mangaba Cultivo de Coco afirmou que o “projeto atende a todos os requisitos legais e regulamentares”, que o Inema definiu condicionantes “que buscam evitar qualquer inadequação ou prejuízo ambiental” e que “será garantido o o das comunidades a todos os caminhos relacionados com a pesca e coleta de mangaba e mariscos”. Saiba mais aqui.

Uma antiga igreja na ilha de Boipeba. Foto: Prefeitura de Cairu/Agência Brasil

Direitos ancestrais 6j644o

Remanescentes de quilombos na ilha baiana vêm sendo reconhecidos pela Fundação Palmares, como o da Comunidade de Boipeba, em 20 de setembro. Há pelo menos outros três povoados similares na ilha, Moreré, Monte Alegre e São Sebastião (Cova da Onça). 

Monte Alegre é reconhecida pela Fundação Palmares desde 2006. Moreré foi certificada há um mês. Cercada pelo projeto Ponta dos Castelhanos, a comunidade de Cova da Onça ainda não reivindicou seu título de remanescente quilombola.

Morador de Boipeba, Benedito da Paixão Santos, o Bio, avalia que os reconhecimentos reforçam o papel das comunidades na preservação de sua cultura afrodescendente, de economias menos agressivas à natureza e de ambientes em terra e mar da Mata Atlântica. 

“A SPU agora tem provas vivas de que Boipeba foi certificada como quilombola. Por isso, esperamos que o projeto não tenha sido suspenso duas vezes apenas enquanto a SPU preparava uma decisão favorável aos grandes empresários”, ressalta.  

Benedito da Paixão Santos (Bio), morador de Boipeba (BA)

Bio defende que a ilha seja mantida como um cenário de agricultura familiar, de extrativismo, de turismo de base comunitária e de outras atividades em sintonia com os ambientes naturais. Tais ações ajudariam igualmente a driblar o desemprego e a pobreza.

O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) indica que, em 2021, o salário médio mensal do município de Cairu era de 1,7 salário mínimo e que apenas 18,1% da população tinha ocupação formal. Mudar isso depende também de iniciativas públicas. 

Dados da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) mostram que a Prefeitura de Cairu recebeu R$ 85,7 milhões em royalties pela exploração de gás natural do Campo de Manati, de 2007 a 2022. Seriam quase R$ 165 milhões atualizados pela inflação do período. 

  • Aldem Bourscheit 3f4l4o

    Jornalista cobrindo há mais de duas décadas temas como Conservação da Natureza, Crimes contra a Vida Selvagem, Ciência, Agron...

Leia também 1b437

Parte da área onde o condomínio privado pode se instalar. Ao centro, o sinuoso rio Catu atravessa o manguezal. Foto: Fellipe Abreu / Mongabay Brasil / O Eco
Reportagens
28 de junho de 2023

Condomínio na ilha de Boipeba aquece ocupação da Mata Atlântica 85r4n

Especialistas avaliam que o projeto fomentará mais o desmate e a tomada de territórios de populações tradicionais no litoral baiano

Salada Verde
10 de abril de 2023

MPF e DPU cobram de Jerônimo Rodrigues (PT) cancelamento de megaprojeto em Boipeba 91w4u

Caso contrário, Justiça pode ser acionada para cancelar de vez o empreendimento, licenciado pelo estado sobre terras públicas federais

Notícias
24 de março de 2023

Órgãos federais de terras e ambiente não aprovaram projeto em Boipeba 422w3p

MPF reitera que o megaempreendimento está em terras públicas da União e pede ao governo da Bahia a sua revogação imediata

Mais de ((o))eco 386al

conservação 4u55e

Análises

Governo do RS ignora perda anual de vegetação campestre para comemorar a ilusão do Pampa conservado 485b4o

Colunas

ONU reúne 2 mil cientistas para transformar conhecimento em ações políticas para o oceano 3r4r1o

Colunas

Podcast inédito explora os ambientes naturais marinhos e costeiros 4x4l1v

Notícias

Ave criticamente em perigo de extinção, soldadinho-do-araripe ganha um refúgio 1k6t67

mata atlântica 3i6w4g

Notícias

Governo cria três novas unidades de conservação na Mata Atlântica 4y656x

Notícias

Brasil tem 34 espécies de primatas ameaçadas de extinção d7343

Análises

A importância da rede de colaboração em prol da conservação dos manguezais no litoral norte do Paraná 314x73

Notícias

A alta diversidade de aves em Bertioga, no litoral de SP 54d1h

bahia 2k4k12

Reportagens

Como comunidades de fecho de pasto conservam o Cerrado no oeste baiano 6x4y6b

Notícias

Estudo reforça importância de proteger a Serra da Chapadinha, na Bahia 1p1g4l

Salada Verde

Ilhéus celebra seu primeiro dia do mico-leão-baiano fq25

Salada Verde

Ocupação fecha os portões do Parque Nacional do Descobrimento, na Bahia 3y6df

Boipeba 4a2f6s

Salada Verde

Lixões ameaçam pessoas e ambientes naturais em Boipeba 6b6t6a

Salada Verde

Privatizar praias bombará a ocupação de regiões como a ilha de Boipeba, na Bahia 3i33r

Reportagens

Governo afirma que projeto na ilha de Boipeba é “incompatível com a legislação” 1p4u2m

Salada Verde

Governo joga decisão sobre projeto na ilha de Boipeba para fim do ano 36bi

Deixe uma respostaCancelar resposta 2s56o

Este site utiliza o Akismet para reduzir spam. Saiba como seus dados em comentários são processados.