Notícias

Turismo de base comunitária como ferramenta de conservação de onças-pintadas 6k5o48

Atividade implicou em aumento da tolerância de comunidade local no Amazonas à presença dos felinos. Resultados de pesquisa podem subsidiar planos de conservação

Cristiane Prizibisczki ·
3 de janeiro de 2025

Estudo realizado pelo Grupo de Pesquisa em Ecologia e Conservação de Felinos na Amazônia, do Instituto Mamirauá mostrou que a presença da atividade de turismo de base comunitária tem ajudado nas ações de conservação de onças-pintadas. O trabalho foi recentemente publicado na revista científica Human Dimensions of Wildlife. 

A pesquisa foi realizada na Reserva de Desenvolvimento Sustentável (RDS) Mamirauá, na região do médio Solimões, Amazonas. Nela, foram ouvidos mais de 100 moradores – beneficiados pelo turismo, ou não – para entender a percepção deles em relação aos grandes felinos e os motivos que os levariam a um eventual abate dos animais.

Nesta RDS, onde o turismo de observação de onças-pintadas em vida livre já está consolidado e os recursos são distribuídos entre membros de toda a comunidade, os pesquisadores conseguiram identificar que, onde a atividade é realizada, os moradores locais têm maior tolerância em relação aos felinos e menos intenção em abatê-los. 

“É comum ouvir dizer que o turismo de observação de fauna ajuda na conservação de espécies ameaçadas de extinção, mas poucos estudos de fato testaram se o envolvimento com turismo influencia na percepção de comunidades locais que, em última análise, são atores-chave na proteção de espécies e ecossistemas”, diz Miguel Monteiro, analista de pesquisa do Instituto Mamirauá e primeiro autor do estudo.

Os resultados do trabalho, dizem seus autores, mostram que o turismo pode servir como uma ferramenta importante para melhorar as relações entre comunidades tradicionais e a vida selvagem, ao mesmo tempo que indica que programas de pesquisa de base comunitária podem contribuir para relações positivas entre comunidades locais e fauna.

Segundo os autores da pesquisa, não existem ainda dados sobre caça de onças-pintadas após a implementação do turismo. Um outro trabalho, publicado em 2022, no entanto, mostra que, entre 2002 e 2019, 71 felídeos adultos foram mortos, sendo a metade deles onças-pintadas.

A maior parte das mortes (88,7%), segundo o estudo de 2022, ocorreu por oportunismo. Isto é, durante expedições de caça direcionadas a outras espécies. Medo de ataque também apareceu como um dos motivos apontados pela população para caça dos grandes felinos.

Ribeirinhos e indígenas participam da atividade de turismo de observação. Renda é dividida com toda comunidade. Foto: Miguel Monteiro

Percepção das comunidades 304c2n

O turismo de base comunitária foi implementado na RDS Mamirauá em 2014. Neste período, a atividade de observação de onças gerou cerca de R$ 49 mil reais em renda para a comunidade da Reserva. Ao considerar todas as atividades desenvolvidas, o recurso chega a R$ 4,3 milhões, divididos igualitariamente a todas as famílias da RDS.

A ((o))eco, Monteiro explica que a maior tolerância aos felinos se deve tanto pela renda gerada pela atividade quanto pelo maior conhecimento dos locais sobre a espécie. 

“Com os dados que coletamos, a gente pôde perceber que as pessoas que trabalham com turismo têm a experiência de ver as onças em uma situação que não é uma ameaça, e elas narram que isso melhorou a percepção e tolerância em relação ao animal. Isto é, a mudança de percepção pesou mais do que o benefício econômico. Por outro lado, tem pessoas na comunidade que não participam diretamente do turismo, mas têm a percepção de que a onça traz benefícios financeiros”, explicou.

Isso foi o que aconteceu com Hilson Rodrigues, morador da RDS e guia local. Segundo ele, o turismo mudou sua percepção sobre os felídeos. 

“Meu pai foi atacado por uma onça, e desde pequeno eu sentia muito medo dela por ouvir as histórias que contavam em minha comunidade. Depois que eu comecei a trabalhar de guia e participei do eio de observação da onça, eu percebi que ela não ataca assim tão fácil. Hoje, quando vejo uma onça, quero pegar meu celular para tirar foto”, disse.

Segundo Miguel Monteiro, as iniciativas de turismo de base comunitária têm aumentado na região da RDS Mamirauá. Por isso, os autores do estudo esperam que os resultados alcançados sirvam de incentivo para novas políticas públicas e atração de investimentos, voltadas aos pequenos empreendimentos que têm surgido. 

Eles também esperam que os resultados ajudem a subsidiar o Plano de Ação Nacional para a Conservação de Felinos, indicando que o turismo pode ser implementado em outras situações onde há conflito, de forma a beneficiar tanto as comunidades locais, quanto espécies ameaçadas de extinção.

“O turismo de base comunitária pode ser uma ferramenta que não só melhora a qualidade de vida de uma forma geral para as comunidades ribeirinhas e indígenas, mas que também ajuda a diminuir a relação de tensão e conflito [entre humanos e animais], aumentando a tolerância das comunidades a certas espécies”, finaliza.

  • Cristiane Prizibisczki 48324h

    Jornalista com quase 20 anos de experiência na cobertura de temas como conservação, biodiversidade, política ambiental e mudanças climáticas. Já escreveu para UOL, Editora Abril, Editora Globo e Ecosystem Marketplace e desde 2006 colabora com ((o))eco. Adora ser a voz dos bichos e das plantas.

Leia também 1b437

Notícias
6 de julho de 2017

Onça em árvores contribui para turismo em Mamirauá 474ut

Comportamento único do felino na região, que a parte do ano sobre árvores, é aproveitado para o ecoturismo, gerando renda e ajudando a aumentar a tolerância ao animal

Notícias
7 de abril de 2017

A maior onça já registrada em Mamirauá (mas existem maiores por aí) 6352m

Onça-pintada capturada por pesquisadores do Instituto Mamirauá é menor que animais encontrados em outras regiões, mas é a maior já registrada em 10 anos de pesquisas em florestas de várzea na Amazônia

Fotografia
16 de junho de 2015

Mamirauá avança no turismo de observação de onças 252r21

A visita de grupos de turismo para ver onças-pintadas na reserva gera renda para as comunidades locais e reduz a caça dos animais.

Mais de ((o))eco 386al

política ambiental 5n5325

Salada Verde

Sociedade civil protesta contra PL que quer acabar com o licenciamento 3e3u1p

Reportagens

Como comunidades de fecho de pasto conservam o Cerrado no oeste baiano 6x4y6b

Notícias

Tribunal de Justiça do RS desobriga companhia de isolar fios para evitar choques em bugios p2065

Notícias

Perda global de florestas atinge recorde em 2024, mostra estudo da WRI 3l3w55

onça pintada 1k20w

Análises

O que cai do mundo não volta mais 6f5m5a

Salada Verde

Assassinato de onça-pintada será investigado pela fiscalização federal 6w684m

Colunas

A pantera de Pembrokeshire 3q6830

Salada Verde

Dez onças são monitoradas na Serra do Mar paranaense 1f2y67

conservação 4u55e

Notícias

Tribunal de Justiça do RS desobriga companhia de isolar fios para evitar choques em bugios p2065

Notícias

Perda global de florestas atinge recorde em 2024, mostra estudo da WRI 3l3w55

Análises

O PL da Devastação e a falsa promessa do progresso o1s2e

Reportagens

Ajustes em trilha podem melhorar sua função de corredor ecológico no Cerrado 4k6c5j

clima e energia 3a4t2x

Notícias

Não cabe ao MMA definir o caminho da política energética brasileira, diz Marina Silva hu4u

Colunas

Nordeste Brasileiro: A Região esquecida no centro do debate climático 3c5m2b

Colunas

Os desafios da diplomacia climática em 2025 2v221n

Reportagens

Congresso aprova marco da eólica offshore com incentivo ao carvão   6240u

Deixe uma respostaCancelar resposta 2s56o

Este site utiliza o Akismet para reduzir spam. Saiba como seus dados em comentários são processados.