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Caçada e atropelada, não tem harpia que resista 6e401o

Perseguida e correndo risco na rodovia BR-101, a maior águia das Américas sofre em um dos seus últimos refúgios na Mata Atlântica.

Em menos de 10 meses, indivíduos de três espécies de grandes vertebrados ameaçados de extinção foram atropelados no trecho da rodovia BR-101 que corta as Reservas Biológica de Sooretama e Natural Vale, no Espírito Santo. Três antas (Tapirus terrestris), sendo uma prenhe, uma onça-parda (Puma concolor) e agora uma harpia (Harpia harpyja) morreram nessa estrada que intercepta duas das reservas de mata atlântica da Costa do Descobrimento, declaradas como Patrimônio Mundial da Humanidade, que formam o maior fragmento contínuo de floresta de tabuleiro do Corredor Central da Mata Atlântica.

Na manhã da última quarta-feira (08), durante o monitoramento de animais atropelados realizado pela equipe da Reserva Biológica de Sooretama, uma fêmea adulta de harpia foi encontrada na margem da BR-101, no canteiro próximo à mata. A ave foi resgatada ainda com vida, porém muito debilitada, e levada imediatamente para o Centro de Estudos e Reintrodução de Animais Selvagens (Projeto Cereias), em Aracruz. No final da tarde, foi conduzida pela equipe do Programa de Conservação do Gavião-real (PCGR) para o Hospital Veterinário da Universidade de Vila Velha. Devido à distância, o animal chegou ao Hospital Veterinário na parte da noite, onde foi imediatamente atendido por professores e médicos veterinários residentes, especialistas em Medicina de Animais Selvagens.

O animal estava bastante prostrado. Recebeu os primeiros socorros e foi colocado em observação para realização dos exames clínicos. Na manhã do dia 09 de abril, após exame físico minucioso, percebeu-se um grande edema na região abdominal, e as radiografias revelaram dois projéteis de chumbo alojados no corpo do animal. A ave foi medicada e colocada em observação novamente. Mesmo com todos os cuidados tomados, ela não resistiu e morreu no início da tarde.

 

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A equipe do laboratório de patologia do hospital realizou a necropsia logo após o óbito, e o laudo conclusivo sobre as causas da morte deve sair em 30 dias. Porém, a equipe adiantou que a harpia apresentava lesões indicativas de trauma, como presença de fraturas em quilha e sinsacro, além de hematomas em abdômen e cabeça e hemorragias em encéfalo e lateral do globo ocular, sendo todas as lesões encontradas no lado direito. Além disso, os projéteis de chumbo foram encontrados um em musculatura peitoral esquerda e outro dentro da cavidade celomática. Aparentemente, não havia correlação das balas com os traumas recentes.

No dia 10 de abril, uma equipe da Universidade Federal do Espírito Santo, que realiza pesquisas sobre os impactos da BR-101 na fauna da região, vistoriou o local que a ave foi encontrada. Vários pedaços de um retrovisor de caminhão Scania foram encontrados espalhados ao redor de onde o animal foi resgatado. A velocidade que os veículos am no local de dia foi mensurada. A média é de 80 km/h, mas muitos am acima de 100 km/h, no trecho em que o máximo permito é 60 km/h. O acidente ocorreu a menos de um quilômetro de um radar fixo de controle de velocidade.

A harpia é maior águia das Américas, pode atingir mais de dois metros de envergadura, possui taxa lenta de reprodução, cria um filhote a cada dois a três anos por casal, e pode viver mais de 40 anos na natureza. A remoção de uma fêmea adulta reduz a viabilidade de populações locais dessa espécie.

No Brasil, no final de 2014, a harpia ou a ser considerada espécie ameaçada de extinção, classificada como vulnerável, em todo território nacional. Na Mata Atlântica, restaram poucos indivíduos e a floresta das Reservas Biológica de Sooretama e Natural Vale é um dos últimos refúgios desta espécie no bioma. A população de harpia nas reservas é monitorada desde 2009 pelo PCGR. Entre os registros, um indivíduo foi avistado em 2011 com um macaco nas garras em uma árvore na margem da rodovia, no mesmo trecho deste atropelamento. As condições que o espécime atropelado foi encontrado retratam as ameaças que a espécie sofre na região, os indivíduos estão sendo caçados e impactados pela rodovia.

O que se pode fazer no curto prazo é aumentar a fiscalização da caça e da velocidade dos veículos na região e levar os animais acidentados imediatamente para um hospital veterinário. Quem sabe as harpias que restam nas reservas ainda resistam.

 

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Saiba Mais
Ação em defesa da Reserva Biológica de Sooretama

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  • Aureo Banhos 333fb

    Aureo Banhos é doutor em genética, conservação e biologia evolutiva e professor da UFES.

  • João Rossi Júnior 2c3i5m

    Médico Veterinário e Professor da Universidade de Vila Velha

  • Flaviana Lima Guião Leite 3w5q58

    Médica Veterinária e Professora da Universidade de Vila Velha

  • Ayisa Rodrigues de Oliveira 464p2a

    Médica Veterinária Residente na Universidade Vila Velha

  • Isabela Hardt 4j2j6w

    Médica Veterinária Residente na Universidade de Vila Velha

  • Maria Cristina Valdetaro Rangel 6r6j6f

    Médica Veterinária e Mestranda do Programa de pós graduação em Ciência Animal da Universidade de Vila Velha

  • Flávia Mara Machado 623j1u

    Médica Veterinária da Universidade de Vila Velha

  • Tânia Margarete Sanaiotti 33501w

    Bióloga e Pesquisadora do Instituto Nacional de Pesquisa da Amazônia

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Comentários 1 3wi3c

  1. cassia diz:

    o que faz alguém como ser humano caçar animais ainda hoje em dia??? só posso entender que são verdadeiras bestas humanas.
    À parte destas bestas, como pode se autorizar uma estrada a ar dentro de uma reserva??? como podemos eleger tão mal nossos representantes??? quanta corrupção!!! que desgosto!!! que tristeza!!! que raiva!!!