Reportagens

Em busca dos macacos perdidos 6q43o

Órgão do governo, Centro de Pesquisas em Primatas completa dez anos com história de sucesso na conservação de espécies ameaçadas de extinção e até mesmo de algumas que estavam desaparecidas.

Vandré Fonseca ·
15 de dezembro de 2011 · 13 anos atrás
A redescoberta do macaco-prego-galego é uma das histórias de sucesso do Centro de Pesquisas em Primatas. Foto: Adriano Gambarini
A redescoberta do macaco-prego-galego é uma das histórias de sucesso do Centro de Pesquisas em Primatas. Foto: Adriano Gambarini
O macaco-prego-galego (Cebus flavius) é uma espécie com distribuição restrita e extremamente ameaçada de extinção. E só há pouco tempo, sua existência foi confirmada pela ciência. Na verdade, ele já havia sido identificado no Século XVII, mas há até pouco tempo, sua existência não era considerada válida pela ciência, ou seja, não se acreditava que pudesse realmente ser definida como uma espécie. Sequer havia sido observado até o início deste século.

No Brasil existem mais de 120 espécies e subspécies de primatas. Entre elas, 47 estão em alguma lista de ameaçadas de extinção.
Mas em 2006, a partir de um estudo conduzido pelo Centro Nacional de Pesquisa e Conservação de Primatas Brasileiros (B) do Instituto Chico Mendes, o macaco-prego-galego foi redescoberto. “O B redescobriu a espécie a partir de indivíduos que chegavam a centros de triagem e também em trabalhos de campo. Daí, então, fizemos uma pesquisa histórica e identificamos a espécie”, conta o coordenador do B, Leandro Jerusalinsky.

Como é uma espécie da Mata Atlântica, já se esperava que o macaco-prego-galego estivesse ameaçado de extinção tão logo foi confirmada a sua redescoberta. Por isto, a área de ocorrência dele foi mapeada pelo B. Ainda existem estudos em andamento, que buscam conhecer melhor a distribuição do animal e o estado de conservação. Há também pesquisas sobre hábitos alimentares e a organização dos grupos.

Já foram obtidas informações importantes sobre a espécie, que hoje está restrita a poucas áreas da Mata Atlântica, ao norte do Rio São Francisco. O macaco-prego-galego já ocupava uma área restrita de Mata Atlântica, a Zona da Mata Nodestina, nos estados de Rio Grande do Norte, Paraíba, Pernambuco e Alagoas, mas que agora está muito mais reduzida. Historicamente, esta floresta foi sendo destruída por sucessivos ciclos econômicos, principalmente o da cana-de-açúcar.

Aniversário

A redescoberta do macaco-prego-galego é uma das conquistas do B, criado em 2001, em João Pessoa. Em outubro completou dez anos de existência. O Centro foi criado ainda no Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (IBAMA) e ou para o ICMBio após as mudanças sofridas em 2008.

O Centro trabalha com espécies que estão entre as mais ameaçadas e que não são objeto de ações ou pesquisa de outras instituições. A busca de informações básicas, como área de ocorrência e ameaças, são importantes para a atuação do centro, que pode propor ações para a preservação, como criação de Unidades de Conservação ou estratégias de manejo. “Desde a criação, é voltado para a pesquisa e conservação de primatas, sendo que esta pesquisa é sempre estratégica para gerar informações para espécies ameaçadas”, conta Jerusalinsky.

Guigó

Espécie de guigó, Callicebus coimbral vive nas matas escassas e ameaçadas do Nordeste. Por isso ganharam unidade de conservação em Sergipe. Foto: João Pedro de Souza-Alves | Clique para ampliar a imagem.
Espécie de guigó, Callicebus coimbral vive nas matas escassas e ameaçadas do Nordeste. Por isso ganharam unidade de conservação em Sergipe. Foto: João Pedro de Souza-Alves | Clique para ampliar a imagem.
No Brasil existem mais de 120 espécies e subspécies de primatas. Entre elas, 47 estão em alguma lista de ameaçadas de extinção. É o caso das duas espécies de guigó (Callicebus coimbrai e Callicebus barbarabrownae), parentes do Parauacu e Uacari que ocorrem na Amazônia e que ganharam uma área protegida em Sergipe, o Refúgio da Vida Silvestre da Mata do Junco.

O que é um guigó?

O guigó é maior do que um sagui e pesa cerca de 1 quilo. Ele ocorre no Recôncavo Baiano e em Sergipe, ao sul do Rio São Francisco.

Descrito em 1999, ele é o mais recente primata descoberto na Mata Atlântica e tão logo foi descoberto entrou para listas de espécies ameaçadas. O guigó é considerado em risco na lista brasileira de espécies ameaçadas e classificado como em perigo, desde 2007, pela IUCN.

Calcula-se que tenham restado cerca de 2 mil guigós na natureza. Mas um grande esforço para o mapeamento e diagnóstico pode mudar a situação de ameaça deste primata. Entre 2004 e 2006, foram realizadas seis expedições para inventário e mapeamento de populações remanescentes das espécies.

Durante este trabalho, foram identificadas 65 populações do Callicebus coimbrai. Os estudos, realizados em colaboração coma Universidade Estadual de Sergipe e Secretaria Estadual de Meio Ambiente, buscam apresentar o habitat, hábitos alimentares e relação com outras espécies ameaçadas, como o macaco-prego-de-peito-amarelo, que ocorre na mesma área.

Outras espécies

Desde 2005, o B estuda o Caiarara (Cebus kaapori), “um primata muito sensível a perturbação do meio ambiente, prejudicado até pelo corte seletivo de árvores”. Foto: Liza Veiga - Banco de Imagens B/ICMBio
Desde 2005, o B estuda o Caiarara (Cebus kaapori), “um primata muito sensível a perturbação do meio ambiente, prejudicado até pelo corte seletivo de árvores”. Foto: Liza Veiga – Banco de Imagens B/ICMBio
Guigós e macacos-pregos-galegos vivem uma situação infelizmente comum entre os primatas da Mata Atlântica. Na verdade, dois terços dos primatas que ocorrem neste bioma estão ameaçados.

Em comum todos os primatas brasileiros vivem em florestas, nas árvores, e sofrem com a caça e perda de habitat. Na Mata Atlântica, a redução da área de ocorrência é ainda mais grave, devido a este bioma ter a maior densidade populacional, de humanos, e restar menos de 10% da floresta original.

Uma das situações mais preocupantes é a do bugio ou guariba (Alouatta ululata), considerado um dos dez primatas mais ameaçados do país. Entre as oito espécies de guariba que existem no Brasil, esta é única que ocorre em uma área de transição, entre Cerrado, Caatinga, Amazônia e Mata Atlântica, em remanescentes de floresta que se estendem do Maranhão ao Ceará. O projeto Ululata, iniciado em 2004, realiza um inventário e mapeamento das áreas de ocorrência da espécie.

Desde 2005, o B estuda o Caiarara (Cebus kaapori), “um primata muito sensível a perturbação do meio ambiente, prejudicado até pelo corte seletivo de árvores”, nas palavras de Jerusalinsky. O caiarara está criticamente ameaçado de extinção. Na Amazônia também existem esforços com o Cepam, WCS e Universidade Federal do Amazonas (Ufam) para protejer o Sauim-de-coleira (Saguinus bicolor).

Há também preocupação com outros temas. Está sendo realizado, por exemplo, um mapeamento de espécies invasoras. “Pessoas pegam para domesticar a levam para outras regiões. Quando é pequeno, é dócil, mas adultos, quando atingem a maturidade sexual, ficam mais agressivos. Aí, soltam em qualquer lugar”, conta… Ele cita os casos de saguis, de macacos-prego, de micos de cheiro – naturais da Amazônia mas com população em Pernambuco, Salvador (BA) e Rio de Janeiro, até mesmo em unidades de conservação.

A estratégia usada pelo CBP é fazer acordos, através de Planos de Ação, para reunir várias instituições, até mesmo com interesses conflitantes, para alcançar um objetivo comum. Estes planos prevêem metas e conjuntos de ações que devem ser implatadas por todos os parceiros. “A gente sabe que o país está se desenvolvendo, sabe que tem impactos e sabe que tem interesses, então…”, afirma o coordenador.

Clique nas imagens para ampliar.
Brachyteles hypoxanthus. Foto: Adriano Gambarini - Banco de Imagens B/ICMBio
Brachyteles hypoxanthus. Foto: Adriano Gambarini – Banco de Imagens B/ICMBio
Cacajao hosomi. Fonte: Jean Philipe Boubli - Banco de Imagens B/ICMBio
Cacajao hosomi. Fonte: Jean Philipe Boubli – Banco de Imagens B/ICMBio
Saguinus bicolor. Fonte: Robson Czaban - Banco de Imagens B/ICMBio
Saguinus bicolor. Fonte: Robson Czaban – Banco de Imagens B/ICMBio


  • Vandré Fonseca 5j195d

    Jornalista especializado em Ciências e Meio Ambiente.

Leia também 1b437

Análises
5 de junho de 2025

Greenwashing e os desafios da restauração ecológica e da Sustentabilidade Corporativa 6b2e5d

Exigências de métodos auditáveis, indicadores científicos confiáveis e certificações rigorosas precisaram ser implantadas, o que tornará imperativo que as empresas adotem práticas socioambientais verdadeiras e eficazes

Notícias
5 de junho de 2025

Governo cria três novas unidades de conservação na Mata Atlântica 4y656x

Criação da APA da Foz do Rio Doce e de duas reservas de desenvolvimento sustentável no Paraná somam mais de 47 mil hectares de novas áreas protegidas no bioma

Reportagens
5 de junho de 2025

Como as unidades de conservação podem resistir à crise climática? b3o6p

Projeto observa também a segurança de populações tradicionais e outras pessoas vivendo dentro ou ao redor dessas áreas

Mais de ((o))eco 386al

conservação 4u55e

Análises

Greenwashing e os desafios da restauração ecológica e da Sustentabilidade Corporativa 6b2e5d

Notícias

Governo cria três novas unidades de conservação na Mata Atlântica 4y656x

Reportagens

Como as unidades de conservação podem resistir à crise climática? b3o6p

Reportagens

O adeus de Niède Guidon, a matriarca da Serra da Capivara i5r34

fauna 4o414o

Notícias

Estudo aponta multiplicação preocupante do peixe-leão no litoral brasileiro 2y2a21

Colunas

Cientistas negras viram a Maré: protagonismo e resistência na ecologia, evolução e ciências marinhas 6m1s35

Notícias

Brasil tem 34 espécies de primatas ameaçadas de extinção d7343

Notícias

A alta diversidade de aves em Bertioga, no litoral de SP 54d1h

primatas 2j572j

Notícias

Tribunal de Justiça do RS desobriga companhia de isolar fios para evitar choques em bugios p2065

Notícias

Brasil tem 34 espécies de primatas ameaçadas de extinção d7343

Salada Verde

Ação prende casal que capturou macaco-prego no Parque Nacional da Tijuca 5o2g6f

Reportagens

Os dois macacos brasileiros entre os mais ameaçados do mundo 3m1n

Capa 2w1x46

Fotografia

A Catedral de Mármore 1l2c1o

Fotografia

Um monte entre as nuvens g2g73

Fotografia

Uma praia sem mar 476f1t

Fotografia

Preikestolen, o Púlpito de Pedra 516z5t

Deixe uma respostaCancelar resposta 2s56o

Este site utiliza o Akismet para reduzir spam. Saiba como seus dados em comentários são processados.