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Gás metano dispara e ameaça meta de 2 graus 5z133q

Estudos lançados nesta segunda-feira mostram que velocidade de crescimento do segundo gás-estufa mais importante aumentou 14 vezes em 9 anos; desmate e agricultura lideram causas

Claudio Angelo ·
12 de dezembro de 2016 · 8 anos atrás
Gado em pasto degradado na Amazônia: rebanho bovino lidera emissões de metano do Brasil. Foto: Ipam
Gado em pasto degradado na Amazônia: rebanho bovino lidera emissões de metano do Brasil. Foto: Ipam

Um consórcio internacional de cientistas largou uma bomba de gás sobre a humanidade nesta segunda-feira: eles mostraram que as concentrações globais de metano (CH4), o segundo gás de efeito estufa mais importante, aumentaram quase 14 vezes de 2007 até 2015. As causas da disparada ainda não estão totalmente claras, mas os cientistas atribuem o grosso do problema a emissões por desmatamento e agropecuária, em especial nos trópicos.

Os números, revelados pela rede G (Global Carbon Project), trazem um desafio adicional para o cumprimento da meta do Acordo de Paris de limitar o aquecimento global a menos de 2oC neste século. A trajetória observada do metano se aproxima do pior cenário de emissões do IPCC, o do clima da ONU. Nesse cenário, conhecido pela sigla R 8.5, o esquentamento da Terra no fim do século 21 ultraa os 4oC em relação à era pré-industrial.

“O aumento foi surpreendente”, disse ao OC o pesquisador catalão Josep “Pep” Canadell, diretor-executivo do G. Ele é coautor de dois estudos publicados hoje: um sobre o balanço global de metano de 2016, com dados de 2000 a 2012, no periódico Earth Systems Data; e outro na revista Environmental Research Letters, com uma análise do que isso significa para o clima, que inclui dados mais recentes, até 2015.

Concentração (no alto) e emissões de metano (esq.) e gás carbônico, comparadas aos cenários do IPCC

Segundo Canadell, o pico de emissões aconteceu nos últimos três anos. Em 2014, por exemplo, a concentração de metano na atmosfera cresceu 12,5 partes por bilhão (ppb), em comparação com uma média de 0,5 ppb no começo do século. Com efeito, nos anos 2000, o metano parecia ter atingido um platô, com concentrações praticamente estagnadas. “Achamos até que estivéssemos fazendo alguma coisa certa”, conta Canadell. Os novos dados assustam os cientistas porque vão quase na direção oposta da concentração de gás carbônico emitido por combustíveis fósseis, que ficou praticamente estagnada em 2014 e 2015.

O metano é emitido em quantidades muito menores do que o CO2. Suas principais fontes são a queima de biomassa, o rebanho bovino e ovino (o popular “arroto” das vacas e ovelhas), a produção de combustíveis fósseis, como o gás natural (que é quase todo metano) e o lixo e o esgoto nas cidades.

Estima-se que em 2012, último ano para o qual as análises mais completas estão disponíveis, suas emissões anuais tenham chegado à casa das 550 milhões de toneladas por ano – contra cerca de 50 bilhões de toneladas de CO2 atualmente. Ele representa 4% do CO2 equivalente.

O problema é que cada molécula de metano esquenta o planeta 28 vezes mais do que uma molécula de CO2. Então, apesar de responder por apenas 4% dos gases-estufa, ele causa 20% da elevação de temperatura, segundo estimativa do Global Carbon Project. A aceleração do crescimento das emissões de metano, se tiver vindo para ficar, significa que nós provavelmente veremos um aumento de temperatura da Terra mais rápido do que os cientistas imaginavam.

“Esses novos dados são um lembrete brutal de que precisamos olhar para o pico de todos os gases de efeito estufa”, afirmou Canadell. “Todos os gases deveriam estar chegando ao pico e declinando muito rápido. As emissões precisam cair a zero.”

De acordo com a análise do G, a América do Sul e o Sudeste da Ásia ocupam os primeiros lugares nas emissões globais de metano – dois terços das emissões estão nos trópicos. No caso sul-americano, as áreas úmidas e cursos d’água lideram as emissões, o que pode ter relação com impactos de secas recentes sobre o balanço de metano dos ecossistemas. Mas seu crescimento é dominado pela agropecuária.

Emissões anuais de metano no período 2003-2012 e sua distribuição entre as regiões do planeta; América do Sul lidera (fonte das ilustrações: G, Environmental Research Letters)

“Acreditamos haver um sinal claro da agricultura”, afirmou Canadell. “Há uma tendência de longo prazo de desmatamento e de crescimento do rebanho que ainda é enorme.” A queima e produção de combustíveis fósseis, como a produção de gás de folhelho nos EUA por fraturamento hidráulico (“fracking”), também é um fator importante de emissão, mas o G considera “improvável” atribuir a escalada global do metano a essa atividade.

Se a notícia do balanço de metano é ruim, por um lado, por outro é possível fazer algo a respeito num prazo curto – diferentemente do que acontece com o CO2. “O metano é um gás lindo”, brinca Pep Canadell. “Se nós fazemos uma coisa agora, vemos o resultado já em dez anos.” Isso porque o tempo de vida do gás na atmosfera é de uma década ou duas, comparado aos mais de 150 anos que o gás carbônico permanece no ar. Além disso, reduzir várias fontes de metano é muito mais barato do que cortar emissões de CO2 – ações como trocar fogões a lenha na África, fazer aterros sanitários no Brasil e reduzir a queima por “flaring” em poços de petróleo no Oriente Médio.

Mas o grande esforço, diz o cientista, precisa vir da agropecuária. “Já temos inovações extraordinárias acontecendo, como novas tecnologias de alimentação de gado que reduzem dramaticamente as emissões. Todo o esforço global que está sendo feito hoje na área de energia, como em painéis solares, precisa de um equivalente na produção de alimentos.”

 

Republicado do Observatório do Clima através de parceria de conteúdo. logo-observatorio-clima

 

 

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Comentários 6 476t61

  1. GPA diz:

    Vamos cuidar mais do nosso mundo!!


  2. Xxx diz:

    Eu estou colaborando e muito com a emissão de gás metano


  3. umbrios27 diz:

    Terrorismo para você é postar um comentário em um blog online, Everardo? Puxa, que mundo legal este onde você vive.
    Mas pessoalmente, eu adoraria estar errada, e que você esteja certo, e que todos esses problemas ambientais que temos não provoquem nada de grave para a humanidade, e as mudanças climáticas sejam tão lentas que mal notemos. Que o futuro seja um lugar feliz, só com problemas de primeiro mundo como decidir quem é que pode ir a qual banheiro. Seria maravilhoso.

    Só que não consigo mais acreditar que nosso futuro vá ser assim, especialmente se não fizermos nada para tentar conquistar um futuro desses, e continuarmos pensando só em comprar o próximo celular, em onde voar de avião para as próximas férias e quantos quilos de carne para o churrasco do domingo. Se você ainda consegue, melhor para você, talvez. Deve ser menos estressante e depressivo.


  4. umbrios27 diz:

    Lembrando que essas 28 vezes a mais levam em conta que a degradação do metano é mais rápida que a do CO2. O efeito imediato de aquecimento do metano é de 72x a mais que o CO2.

    E, para piorar: a degradação rápida depende da presença de ions hidroxila (OH-) na atmosfera. Dependendo de ONDE e de QUANTO metano é emitido, é possível que "falte" ions hidroxila para degradar o metano, fazendo com que ele fique mais tempo na atmosfera. Como ions hidroxila costumam ser emitidos pela vegetação, funciona mais ou menos assim:

    –> O arroto de um boi no meio de um pasto *saudável* pode degradar de CH4 para CO2 em minutos, fazendo com que o metano produzido aqueça até menos que as 28x calculadas.
    –> O arroto do mesmo boi em um pasto degradado demora mais para degradar, e vai aquecer as 28x calculadas.
    –> O arroto desse boi e seus vinte e nove companheiros de lote em uma criação intensiva alimentada a grãos (situação em que, inclusive, os bovinos emitem mais metano) vai ser um tanto pior ainda que as 28x.
    –> O permafrost derretendo em locais onde quase não há vegetação na tundra do Canadá e da Sibéria… dependendo da quantidade de metano liberada e da época (quanto mais perto do início da primavera pior) pode causar emissões de metano que demorem muito mais a se degradar que o normal, por pura falta de ions OH- . Dependendo da situação, o metano pode chegar a causar um aquecimento próximo de 60x o do CO2 (se considerado o aquecimento em 100 anos, que é o que normalmente se calcula).

    Ou seja, é mais complicado ainda e mais perigoso ainda. Precisamos tentar diminuir a intensividade de carbono na nossa economia (trocar combustíveis fósseis por renováveis, reflorestar ao invés de desmatar, diminuir ao máximo o desperdício e o consumismo) o mais rápido possível, ou essa discussão toda sobre Previdência que está rolando nos fóruns de política vai ficar só teórica mesmo, pois na hora que chegarmos aos 65 anos (considerando quem tem uns 20 hoje) vamos estar catando os cacos da nossa civilização.


    1. Everardo diz:

      "…vamos estar catando os cacos da nossa civilização." Se isso não acontecer, podemos cobrar de vc pelo terrorismo?


  5. paulo diz:

    Preparem, a chegada da choradeira, aqui no Brasil. Vão espenear, chutar, gritar, acusar, vai ser um choro só. Principalmente dos tais do Agro é tudo.

    É só esperar.