Nos últimos tempos, tenho me perguntado: por que os influenciadores digitais, com todo o alcance que têm, não direcionam sua força de comunicação para fortalecer territórios, culturas e causas socioambientais? Se é possível mobilizar milhões de pessoas para tendências vazias, por que não para a valorização da Amazônia e dos
povos que vivem aqui?
Entendo que o engajamento nas redes gira muito em torno de números, de seguidores e visibilidade. Mas justamente por isso, não seria hora de começarmos a usar esse mesmo poder de influência para despertar um olhar diferente sobre o Brasil profundo? Sobre o que é, de fato, relevante para o nosso futuro comum?
A Amazônia não pode continuar sendo um cenário exótico onde os outros falam por nós. E, no entanto, mesmo entre os que vivem aqui, nem sempre temos usado as palavras e os espaços para nos enxergar com a força que temos. Isso se revela agora, por exemplo, na preparação para a COP 30.
Quantos eventos globais de relevância ocorrem de fato na região Norte? São raros. Por isso, a escolha de Belém como sede da Conferência das Partes das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas deveria ser motivo de articulação e fortalecimento. No entanto, vejo surgir novamente um velho comportamento: o de colocar em dúvida nossa capacidade. Lembro da Copa do Mundo, em 2014, quando Manaus foi uma das sedes. Logo surgiram vozes dizendo: “Mas o Amazonas nem
tem tradição no futebol”. Agora, o tom é parecido: “Mas será que Belém tem estrutura suficiente?”
Essa dúvida pode até ter alguma base. Sim, temos desafios de infraestrutura. Mas essa também é a realidade de boa parte do Brasil. O que está em jogo aqui não é apenas a logística de um evento, e sim a oportunidade de ocupar um espaço de protagonismo que historicamente nos foi negado. A COP 30 não é apenas sobre política climática, ela é uma vitrine internacional de narrativas, compromissos e disputas simbólicas. E a Amazônia precisa estar presente com força.
É nesse ponto que volto aos influenciadores. Se temos profissionais da comunicação com alcance massivo, com potencial de moldar percepções e comportamentos, por que esse capital simbólico não está sendo canalizado para engajar pessoas em temas como Amazônia, mudanças climáticas, adaptação e justiça climática? Existem vozes comprometidas, é verdade, e elas precisam ser mais visibilizadas.
Pessoas como Isabelle Nogueira, que levou a cultura e a identidade amazonense ao conhecimento do país; Marciele Albuquerque, influenciadora que está em constante defesa dos povos indígenas e da Amazônia; Zé na Rede, comunicador e ativista digital que utiliza as redes sociais para destacar a identidade indígena e amazônida; Pavulagem, que celebra a música, o território e o orgulho nortista; e Tainara Kambeba, indígena ativista e comunicadora que traduz em palavras e imagens a força do seu povo. Esses nomes mostram que é possível influenciar com propósito, com raiz e com verdade.
Acredito que parte dessa mudança começa em como nos vemos e em como queremos que o mundo nos veja. Muitas vezes, somos os primeiros a desacreditar de nós mesmos. Preferimos apontar nossas fraquezas do que valorizar nossas potências. Se nós mesmos não nos reconhecemos como parte essencial das soluções globais, como podemos esperar que os outros nos enxerguem assim?
A COP 30 é uma chance real de reverter isso. Mas é preciso estratégia e coragem. É preciso levantar a cabeça e entender que não somos menores. Temos tradição, temos cultura, temos ciência de base comunitária e uma sabedoria ancestral que pode ensinar ao mundo caminhos para enfrentar a crise climática.
Está na hora de influenciar diferente. E de ampliar o alcance da comunicação com propósito. A Amazônia não pode continuar sendo apenas um discurso para os outros se engajarem. Ela precisa ser o centro da nossa própria narrativa — contada por nós, vivida por nós, defendida por nós.
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