Colunas

O papel do jornalismo na construção de uma nova mentalidade diante da Emergência Climática 4r61x

Assumir a responsabilidade com a mudança de pensamento significa assumir o potencial do jornalismo em motivar reflexões e ações que impactam a sociedade

27 de março de 2024 · 1 anos atrás
  • Grupo de Pesquisa em Jornalismo Ambiental 3l113f

    Busca contribuir na constituição de um referencial teórico sobre jornalismo ambiental em perspectiva interdisciplinar

  • Clara Aguiar 6u16x

    Estudante de Jornalismo da Faculdade de Biblioteconomia e Comunicação da UFRGS

  • Débora Gallas Steigleder 604f5p

    Jornalista da Agência Bori e pesquisadora do Grupo de Pesquisa Jornalismo Ambiental da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Mestre e doutora em Comunicação pela UFRGS.

A informação é essencial para a sensibilização da sociedade sobre os impactos humanos no sistema climático do planeta. De acordo com um estudo de pesquisadores da Fundação Getúlio Vargas (FGV), 94% das pessoas acreditam que estamos ando por uma mudança climática e 91% pensam que o fenômeno é causado principalmente pela atividade humana. No entanto, os dados coletados revelam que apenas 56% acreditam que isso seja grave. Nesse cenário, a informação jornalística devidamente apurada e com rigor ético pode colaborar para um melhor entendimento sobre as variáveis que envolvem as mudanças climáticas. 

O jornalismo é um serviço público que presta informações relevantes à sociedade e, por meio de uma cobertura qualificada, regular e crítica, pode conscientizar os cidadãos sobre como as mudanças climáticas já afetam as suas realidades e sobre as possibilidades de mobilização coletiva por medidas de enfrentamento, mitigação e adaptação. O jornalismo tem por essência o compromisso de fornecer informações que ajudam a sociedade a entender a complexidade dos acontecimentos do mundo. Quando as mudanças climáticas estão em pauta, é função primordial dos jornalistas promover uma contextualização que explique termos científicos, exponha os causadores do problema e aponte soluções possíveis. 

No artigo “O Jornalismo Ambiental como agente da mudança de pensamento no contexto da emergência climática”, desenvolvido por pesquisadoras do Grupo de Pesquisa em Jornalismo Ambiental (CNPq/UFRGS), foram elencados sete pressupostos que os jornalistas devem incorporar em suas rotinas produtivas para auxiliar na percepção pública acerca das mudanças climáticas. São eles: ênfase na contextualização; pluralidade de vozes; assimilação do saber ambiental; cobertura próxima à realidade do leitor; comprometimento com a qualificação da informação; incorporação do princípio da precaução e a responsabilidade com a mudança de pensamento. 

Este último pressuposto se relaciona à função educativa do jornalismo, isto é, à interconexão entre o jornalismo e a educação ambiental/climática. A responsabilidade com a mudança de pensamento visa promover uma mudança de comportamento por meio da produção de informações ambientalmente corretas. Isso porque a forma como as mudanças climáticas são abordadas em notícias e reportagens influencia na compreensão pública da questão, o que pode facilitar ou dificultar a conscientização e mobilização da população.

As mudanças climáticas são o sinal mais evidente de que é preciso questionar o paradigma capitalista da exploração dos bens naturais e da concentração das riquezas. Porém, para serem capazes de criar soluções sustentáveis como alternativa a esse quadro, os sujeitos devem se abrir ao diálogo e a outras visões de mundo – especialmente aquelas que são invisibilizadas pelas relações de poder vigentes. Uma prática jornalística comprometida com a diversidade de perspectivas ante ao discurso dominante do progresso a qualquer custo pode auxiliar nesse processo de transformação social. 

O jornalismo cumpre a sua responsabilidade com a mudança de pensamento quando aponta de forma incisiva os maiores responsáveis pelas mudanças climáticas. Desde a Revolução Industrial são emitidas toneladas de gases de efeito estufa (GEE), como dióxido de carbono (CO2), metano (CH4) e óxido nitroso (N20), devido às atividades industriais e ao agronegócio. No setor energético, as emissões são predominantemente resultantes da queima de carvão, petróleo e gás para geração de eletricidade e transporte. Já no agronegócio, práticas agrícolas intensivas, incluindo o desmatamento para expansão de terras, a criação de gado e o uso de agrotóxicos, são responsáveis pela alta emissão de gases poluentes. Isso quer dizer que a queima prolongada de combustíveis fósseis e o uso insustentável de energia e do solo são os maiores intensificadores das mudanças climáticas. É dever do jornalismo explicitar isso. 

O jornalismo cumpre a sua responsabilidade com a mudança de pensamento quando aponta os mais ricos como os principais investidores em indústrias poluentes e estilos de vida que resultam em grandes emissões de CO2, desmistificando o senso comum de que os mais pobres são os que mais poluem. Os dados são do relatório Igualdade Climática: Um Planeta para os 99%, realizado pela organização não governamental Oxfam. De acordo com os cálculos da Oxfam, um imposto de 60% sobre a renda do 1% mais rico do mundo resultaria em uma arrecadação de US$ 6,4 trilhões, recursos que poderiam ser direcionados para combater a crise climática. Esses fundos poderiam ser utilizados para financiar a transição energética e para ajudar países e regiões que enfrentam impactos significativos em suas populações. 

O jornalismo cumpre a sua responsabilidade com a mudança de pensamento quando traz para a centralidade do debate a questão da justiça climática, tendo em vista que, embora as mudanças climáticas sejam uma realidade global, suas consequências impactam a população de maneira desigual, atingindo mais quem vive na pobreza, mulheres e meninas, pessoas pretas, comunidades indígenas, quilombolas e ribeirinhas do Sul Global. É preciso evidenciar que as populações das periferias são as que menos produzem gases de efeito estufa, mas são as mais afetadas pelos eventos extremos climáticos, como enchentes e deslizamentos de encostas dos morros.

Apesar de suas óbvias diferenças em relação a um espaço de educação formal, como as escolas, o jornalismo não deve menosprezar seu alcance e presença na rotina da população. Neste sentido, assumir a responsabilidade com a mudança de pensamento significa assumir o potencial do jornalismo em motivar reflexões e ações que impactam a sociedade.

Assim como já discutimos na coluna “A cobertura da crise climática: o que pensam os públicos engajados sobre o trabalho jornalístico?”, informar de modo a contextualizar, conscientizar e mobilizar a população sobre o tema não é uma tarefa simples e exige tempo, qualificação profissional e abertura editorial dos veículos de comunicação. Mas é urgente a necessidade de ampliar a produção de informações que auxiliem na compreensão da realidade e na construção de uma nova forma de pensar a situação atual, além de apresentar estratégias verdadeiramente eficazes de enfrentamento à emergência climática. 

As opiniões e informações publicadas nas seções de colunas e análises são de responsabilidade de seus autores e não necessariamente representam a opinião do site ((o))eco. Buscamos nestes espaços garantir um debate diverso e frutífero sobre conservação ambiental.

Leia também 1b437

Colunas
6 de novembro de 2023

Princípio da precaução no jornalismo: cobertura sobre crise climática deve antecipar riscos 4a1q5p

Lidar com a antecipação de possíveis danos não é possível sem uma percepção pública sobre os riscos iminentes da crise climática

Colunas
4 de setembro de 2023

Relações entre eventos extremos e emergência climática: a imprensa e a resiliência nos municípios 395a31

Os eventos extremos são acontecimentos que irrompem a “normalidade” cotidiana e, por isso, despertam o interesse público. Nesse sentido, necessitam de uma cobertura jornalística abrangente e contínua

Colunas
2 de agosto de 2023

A cobertura da crise climática: o que pensam os públicos engajados sobre o trabalho jornalístico? 4s4y

Pesquisa nacional realizada com ativistas revela percepções sobre o papel do jornalismo frente à crise climática

Mais de ((o))eco 386al

jornalismo ambiental k194b

Salada Verde

Eleita a nova diretoria da Rede Brasileira de Jornalismo Ambientais  6b562

Colunas

O que o Jornalismo pode fazer em tempos de crise climática? 3n2z5p

Salada Verde

Com cocuradoria de ((o))eco, Abraji lança curso sobre COP30 para jornalistas e comunicadores 4a1h4f

Notícias

((o))eco lança página especial sobre COP 30 6q5p66

mudanças climáticas 4jg2j

Reportagens

Brasil aposta na conciliação entre convenções da ONU para enfrentar crises globais 3p1w31

Notícias

Chuvas aumentaram em 10 vezes o desmatamento causado por eventos extremos no RS 6x3p3b

Salada Verde

Evento no RJ discute protagonismo da juventude no enfrentamento da crise climática 2g53r

Colunas

Leão XIV no cenário climático 341r2d

política ambiental 5n5325

Reportagens

Brasil aposta na conciliação entre convenções da ONU para enfrentar crises globais 3p1w31

Reportagens

Maior área contínua de Mata Atlântica pode ser mantida com apoio do turismo 91ys

Reportagens

Petroleiras aproveitam disputas entre indígenas e ocupam papel de Estado enquanto exploram territórios no Equador 182e18

Notícias

Desmatamento em Unidades de Conservação cai 42,5% em 2024 2c96d

Capa 2w1x46

Fotografia

A Catedral de Mármore 1l2c1o

Fotografia

Um monte entre as nuvens g2g73

Fotografia

Uma praia sem mar 476f1t

Fotografia

Preikestolen, o Púlpito de Pedra 516z5t

Deixe uma respostaCancelar resposta 2s56o

Este site utiliza o Akismet para reduzir spam. Saiba como seus dados em comentários são processados.

Comentários 1 3wi3c

  1. Ah! Hahahahahaha! Meus nobres mudança de mentalidade? Venho dizendo isso a muito tempo! Será que ainda não foi percebido que os métodos da revolução industrial, revolução verde, revolução tecnológica estão fadados a exaustão? Sem a reformulação do PENSAMENTO ? Não precisa ser cientista para identificar que os métodos do século XIX, não dará mais certo!. Mas se, se continuar se insistindo na repetição e não no pensamento, não precisa ser matemático ou químico ou ainda físico que a escolha que fizemos ou que nos foi imputado. Não vai dá certo!