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Pesquisadores lideram projeto para proteger chimpanzés na Uganda 372z70

Vítimas colaterais, chimpanzés são feridos e até mutilados pelas arapucas de caçadores. Projeto investe na remoção das armadilhas para salvá-los

Heloisa Gamero ·
8 de julho de 2024

Instalação de armadilhas são frequentes na floresta tropical do Parque Nacional da Floresta de Kibale, em Uganda, em decorrência de um pequeno mercado de carne na região. Com foco em uma espécie pequena de cabrito, denominada “duiker” em inglês, caçadores projetam arapucas feitas com metais afiados. A armadilha, entretanto, também afeta os chimpanzés que vivem no parque, causando feridas e até mesmo amputações. Diante desse cenário, os primatologistas se uniram para desarmar essa ameaça. 

“Sempre tive um fascínio pelos chimpanzés, pelos grandes primatas, porque são os parentes mais próximos do ser humano”, relata John C. Mitani, primatólogo, ecologista comportamental de primatas e pesquisador envolvido no projeto de remoção de armadilhas. 

Mitani iniciou sua pesquisa no Ngogo Chimpanzee Project (Projeto Chimpanzé Ngogo, em tradução livre) em 1995. E, juntamente com a Autoridade de Conservação da Vida Selvagem do Uganda, fez parte do projeto de conservação dos chimpanzés, onde desenvolveu atividades de pesquisa e remoção das armadilhas. 

Mitani conta que quando iniciaram os estudos na região do parque tinham evidências óbvias de chimpanzés lesionados pelas armadilhas de caça. Quase 20% deles possuíam lesões, como perda de dedos. O primeiro o foi levantar esses dados.

Após 14 anos monitorando os chimpanzés, eles contabilizaram 12 indivíduos feridos por armadilhas. Decidiram, então, fazer algo a respeito.

Chimpanzé com a perna amputada por armadilha. Foto: Kevin Langergraber

Foi quando, em 2011, o projeto entrou numa nova fase e iniciou a contratação de profissionais locais para destruir as armadilhas de caçadores que encontravam no Parque de Kibale e ao redor. “E continuamos até hoje, o projeto se expandiu de forma impressionante até o ponto em que hoje temos oito equipes separadas que operam em todo o parque”, conta John Mitani. 

Segundo o artigo publicado na revista científica Primates, durante os 14 anos anteriores à remoção das armadilhas, foram registrados 12 indivíduos feridos. Após quase 13 anos desde o início do projeto, apenas um chimpanzé foi atingido por uma das armadilhas. 

Questionado sobre o sucesso da atividade, Mitani atribui à proteção que pesquisas de longo prazo dão aos animais estudados. “Nós temos contato mínimo com os caçadores. Eles nos veem. Eles sabem claramente que não poderiam estar ali, porque é um parque nacional. Eles têm medo da gente e fogem”, conta. 

“Tem muitos estudos que mostram que a presença de pesquisadores nesses estudos de longo prazo traz benefícios tangíveis. As pessoas ficam longe dos animais que estão sendo estudados. Vão para outras áreas e foi o que aconteceu aqui”, completa o primatólogo. 

Graças ao James Tibisimwa, líder do Ngogo Chimpanzee Project e um dos co-autores do artigo, a remoção das armadilhas ganhou métodos eficientes. Seu pai era um caçador antes do Parque de Kibale se tornar protegido e James o acompanhava, aprendendo como rastrear e desarmar uma armadilha – habilidade que, futuramente, usou para treinar equipes em prol da conservação dos chimpanzés. 

Apesar de não matarem os primatas instantaneamente, os ferros afiados podem perfurar profundamente, fazendo com que eles fiquem presos por dias, semanas e até meses. Quando conseguem se soltar sozinhos, saem com feridas graves ou mesmo a perda de membros. 

Mitani conta que, no começo, tinha muitas preocupações relacionadas a interferir no processo de soltura dos grandes animais. “Para retirar uma armadilha de um chimpanzé, você tem que apagá-lo com sedativo. E não é um efeito rápido, você atira um dardo com o sedativo no animal e é provável que se alarme. Ele pode subir em uma árvore e ir 15, 30 metros acima do chão. Quando o efeito do anestésico finalmente o atinge, ele pode cair e morrer com a queda. Por isso sempre me preocupo em fazer algo assim, você não quer matar um chimpanzé para tentar retirar uma armadilha”, explica.

Hoje em dia o projeto conta com profissionais treinados para remover as armadilhas dos chimpanzés, além do apoio da equipe veterinária da Uganda Wildlife Authority (Autoridade da Vida Selvagem de Uganda, em tradução livre). 

Time original de destruição de armadilhas, liderados por James Tibismwa. Foto: John Mitani/Arquivo

A vivência dos pesquisadores mostra que esses instrumentos de caça podem obviamente afetar a saúde, a sobrevivência, a reprodução e até mesmo o crescimento dos chimpanzés. Os dados ainda serão consolidados para publicação científica. Alguns desses indivíduos capturados, por exemplo, quando crescem e se tornam adultos, nunca atingem o tamanho de outros indivíduos que não foram atingidos. O que no mundo dos chimpanzés pode significar uma chance menor de sobrevivência.

Chimpanzés (Pan troglodytes) são grandes primatas que podem medir a altura de um humano, com até 1,67m de altura e até 60 quilos. Eles vivem em grupos e podem chegar até os 45 anos. A espécie é considerada Em Perigo pela Lista Vermelha da IUCN – União Internacional para a Conservação da Natureza, em português.

“As três principais razões são a perda de habitat, o comércio de carne que existe em partes da África e, terceiro e menos conhecido, está a transmissão de doenças. Por conta da Covid, todos estão familiarizados com o fato de que animais podem nos transmitir doenças, o que não é falado é que funciona ao contrário também. Nós podemos transmitir doenças para animais, especialmente para os chimpanzés que possuem um parentesco tão próximos aos humanos. Frequentemente eles são infectados com os mesmos tipos de patógenos e muitos estudos mostram que humanos infectaram grandes primatas com patógenos de doenças humanas e mataram os animais no processo”, pontua John Mitani. 

  • Heloisa Gamero 534t4x

    Estudante de Jornalismo na Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), observadora de pautas ambientais e de direitos humanos no mundo inteiro

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