Reportagens

Operação de guerra contra o fogo 6v5l10

Com 200 mil ha queimados no Parque Nacional do Araguaia, Tocantins convoca exército para combate às chamas.

Leilane Marinho ·
27 de agosto de 2010 · 15 anos atrás
Fogo na Ilha do Bananal, Parque Nacional do Araguaia: 45% da vegetação queimada. Crédito: ICMBio.
Emissão de CO

No dia 25, o Inpe estimou que 41.741 toneladas de Monóxido de Carbono (CO) foram emitidas por queimadas e fontes urbano/industriais no Tocantins. Em agosto, foram 1.048.968 toneladas.

Palmas – Sem chuva há mais de 120 dias e com temperatura máxima de 38 graus – dois a mais que o registrado em 2009 – o Tocantins arde nas chamas de mais de 5.6 mil focos de fogo detectados somente no mês de agosto. O número quadruplicou em relação ao mesmo período de 2009, que teve 1.071 focos. A área mais atingida é o Parque Nacional do Araguaia (PNA), que dos seus 562,3 mil hectares (ha), quase 240 mil já foram consumidos pelas queimadas, segundo estimativas mais recentes, considerando imagens de satélite.

No dia 25, uma estratégia de guerra contra o fogo foi montada na Ilha do Bananal, maior ilha fluvial do mundo, com 1.916.225 ha – sendo um quarto pertencente ao parque. “É uma situação muito crítica. O fogo atingiu a ilha de forma surpreendente e devastadora”, contou o coordenador regional da Fundação Nacional do Índia (Funai), Clésio Fernando Moraes, depois de percorrer a região destruída pelas labaredas que avançam em velocidade impressionante.

A situação, que culminou na destruição de 45% da Ilha, está sendo controlada com a chegada de 50 militares do 22º Batalhão do Exército, junto às outras frentes de combate formadas por 50 brigadistas do PrevFogo (Ibama), 40 homens do Corpo de Bombeiros e 15 indígenas. A equipe atua no quadrilátero do fogo construído pelos municípios de Lagoa da Confusão e Formoso do Araguaia, no Tocantins, e São Felix do Araguaia e Santa Isabel, no Mato Grosso.

Dois helicópteros, dois aviões e um caminhão estão operando no combate. Coordenadores da campanha esperam eliminar o último foco nos primeiros dias de setembro.

Área queimada no Parque Nacional do Araguaia. Foto: ICMBio.

Sem chuvas, fogo deve aumentar

Ao todo, 20 municípios tocantinenses estão na lista do decreto nº 4.144, assinado no dia 19 de agosto pelo governador Carlos Henrique Gaguim (PMDB). O documento declara situação de emergência no Estado em função das queimadas, baixa umidade do ar atmosférico – que já chegou a 11% – e outros danos ambientais causados pelas altas temperaturas e clima seco. A água já dá sinal de escassez, principalmente na região sudeste do estado.

Segundo o decreto, o fogo já teria consumido 66% da área do Parque Estadual do Lageado, 65 mil ha do Corredor Ecológico do Jalapão (Parque Estadual Serra Geral) e 35 mil ha da Estação Ecológica Instituto Chico Mendes, além do grande incêndio no PNA, que faz limite com o Parque Estadual do Cantão, que também foi atingido pelas queimadas.

O coordenador-geral de Proteção Ambiental do Instituto Chico Mendes (ICMbio, órgão do Ministério do Meio Ambiente) declarou que se tratando das Unidades de Conservação (UCs), a situação do Tocantins é a mais preocupante. O Estado é segundo na lista dos brasileiros que mais sofre com as queimadas, perdendo apenas para Mato Grosso. De acordo com o PrevFogo regional, imagens de satélite denunciam o surgimento de novos focos que tende a aumentar nos próximos dias. A previsão, feita pelo Núcleo Estadual de Meteorologia e Recursos Hídricos (Nemet– RH), anuncia que as chuvas só devem molhar as terras tocantinenses em outubro.

Nas margens do Araguaia, o maior incêndio

Imagem de satélite mostra focos de incêndio no Araguaia no dia 17 de agosto. Crédito NASA.

A região que faz divisa com o Pará, terra dos índios Javaé e Karajá, é a que mais sofre com o fogo. Segundo dados do Instituto Natureza do Tocantins (Naturatins), nos dias 21 e 22 de agosto foram 1.293 focos de incêndio. No dia 26, imagens de satélite confirmaram 544 focos, que atingiu inclusive as aldeias indígenas.

“Fomos pegos de surpresa, pois historicamente estes incêndios acontecem na segunda quinzena de agosto. É a primeira vez que acontece em julho”, lembra Fernando Tizianel, chefe do Parque Nacional do Araguaia – Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodversidade (ICMBio).A região que faz divisa com o Pará, terra dos índios Javaé e Karajá, é a que mais sofre com o fogo. Segundo dados do Instituto Natureza do Tocantins (Naturatins), nos dias 21 e 22 de agosto foram 1.293 focos de incêndio. No dia 26, imagens de satélite confirmaram 544 focos, que atingiu inclusive as aldeias indígenas.

A grande peculiaridade em xeque no parque é a inusitada mistura do gigantismo da floresta Amazônia com as belezas áridas do Cerrado. Importantíssimas, do ponto de vista científico, por ser uma zona de ecótono entre os dois biomas, as terras do PNA abrigam elementos que não são encontrados em nenhum outro habitat, muitos deles ainda desconhecidos. “O parque recebeu o título Sítio Ramsar, por ser uma zona úmida de relevância mundial”, acrescenta Tizianel. A fauna tem espécies comuns ao Pantanal Mato-Grossense, como a onça-pintada, boto, uirapuru, garça-azul e tartaruga-da- amazônia.

Criado em 1959, o PNA protege uma importante amostra das áreas inundáveis da planície do rio Araguaia, responsável pela reprodução de espécies aquáticas. Na região ocorre uma formação vegetacional exclusiva, denominada de ipuca.

“Estes fragmentos florestais (ipucas) que ocorrem no cerrado são extremamente peculiares, que só se constituem nas planícies. Quando queimadas, dificilmente conseguimos recuperá-las”, lamenta a professora e doutora em avaliação de impactos ambientais e recuperação de áreas degradadas da Universidade Federal do Tocantins (UFT), Iracy Martis, que há 15 anos estuda o PNA.

Para ela, muitas espécies endêmicas poderão desaparecer. “Em conseqüência dessa transição, existem uma biodversidade muito própria do parque. É evidente que com a devastação do fogo muitas que inclusive já estão em risco de extinção, como várias espécies de veados, podem desaparecer”, afirma a pesquisadora.

De acordo com Tizianel, o ICMBio não possui estudos que especifique o impacto do fogo no parque, mas um plano de recuperação das áreas atingidas será traçado.

Peleja contra o fogo

Parque Nacional do Araguaia é ecossistema único formato do encontro da Amazônia com o Cerrado. Foto: ICMBio.

Conter o fogo no Tocantins não é uma tarefa fácil. O Estado, que todos os anos arde consumido pelo fogo, não possui aeronaves que auxiliam o combate nas regiões mais inóspitas, sem estradas, e mesmo os focos próximos à zona urbana, como o ocorrido no início de agosto no Parque Estadual do Lajeado (com 15 dias de duração), há poucos quilômetros da capital Palmas, são difíceis de controlar por falta de transporte terrestre. Com queimadas por toda parte, as duas caminhonetes de combate florestal do Corpo de Bombeiros Militar são insuficientes.

No último dia 15, a ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira, sobrevoou a Serra do Lajeado e constatou a precariedade com que os brigadistas combatiam as labaredas. Diante da incontrolável situação, ela anunciou o envio de aeronaves como parte do plano de ações que estaria sendo traçado para a contenção das chamas.

A intervenção do Exército na Ilha do Bananal faz parte desse plano. O presidente do Instituto Chico Mendes, Rômulo Mello, expôs a situação caótica enfrentada pelos brigadistas no PNA. “Nós temos dificuldade muito grande de deslocamento, daí a necessidade de helicóptero que é utilizado pelas tropas, porque permite carregar os brigadistas de um lugar para o outro mais rapidamente. Lá na estação ecológica os brigadistas precisam andar 5 horas para chegar ao local, e eles chegam cansados e depois, como o fogo se alastra rápido, corre o risco de não ter mais o que apagar”, disse à ministra.

O governador Carlos Henrique Gaguim (PMDB) busca financiamento junto ao Governo Federal, através do Fundo Amazônia e do BNDES, que forneceriam um incentivo aproximado de R$ 48 milhões (R$ 14 milhões de compensação pela preservação pelo Fundo e R$ 34 milhões de recurso pelo Banco) para a conservação do meio ambiente e a aquisição de todo o equipamento planejado.

Sobre 48 milhões

Segundo informações da assessoria de comunicação da Defesa Civil do Tocantins, dos R$ 48 milhões, R$ 14.324 milhões já foram contratados, e as aquisições de equipamentos devem iniciar-se em setembro. Com o valor, está prevista inicialmente a aquisição de 17 caminhões autotanque – para abastecimento das viaturas de combate a incêndio; 6 caminhões autobomba tanque; 22 embarcações náuticas de médio e pequeno porte; 22 viaturas de resgate (tipo SAMU) e 15 caminhões de busca e salvamento.

“Sobre a outra parte do financiamento, refere-se a viaturas autoescada e plataforma, para o combate de incêndio urbano, em locais altos, além de viaturas específicas para combate a incêndio florestal, que serão adquiridas nos próximos exercícios, já que se tratam de veículos importados”, disse a Defesa Civil através de nota.

Além destes, outros R$ 20 milhões, também oriundos do Fundo Amazônia, servirão para a aquisição de viaturas e equipamentos e duas aeronaves (um helicóptero e um avião).

*Leilane Marinho é repórter em Palmas (TO)

  • Leilane Marinho 27425r

Leia também 1b437

Fotografia
2 de junho de 2025

Galeria: Veja como foram os atos contra o PL da Devastação 4h4vf

Centenas de manifestantes foram às ruas contra o avanço do Projeto de Lei que implode o licenciamento ambiental. Projeto está tramitando na Câmara

Salada Verde
30 de maio de 2025

Sociedade civil protesta contra PL que quer acabar com o licenciamento 3e3u1p

Mobilização ocorre em ao menos 12 capitais. Protestos estão marcados para ocorrer neste domingo e marcam o início da semana do meio ambiente

Salada Verde
30 de maio de 2025

Chance de aquecimento da Terra ultraar 1,5°C aumentou, mostra estudo 6h3f5g

Países caminham para que a principal meta do Acordo de Paris seja descumprida. Chance de que o aquecimento fique entre 1,5ºC e 1,9ºC em pelo menos um dos próximo cinco anos é de 86%, diz ONU

Mais de ((o))eco 386al

tocantins u6g28

Salada Verde

Assassinato de onça-pintada será investigado pela fiscalização federal 6w684m

Reportagens

O misterioso declínio do pato-mergulhão no Tocantins 1t4j47

Salada Verde

Brigadista do Ibama é assassinado na porta de casa no Tocantins 5ww27

Notícias

As aves do Tocantins 1m65v

unidades de conservação 4x4ed

Notícias

Perda global de florestas atinge recorde em 2024, mostra estudo da WRI 3l3w55

Notícias

Em audiência tensa no Senado, PL-bomba e Foz do Amazonas dominam a pauta 3k1x1u

Colunas

Mercantilização e caos no licenciamento ambiental brasileiro 6y4jn

Notícias

Com mudanças de última hora, projeto-bomba do Licenciamento é aprovado no Senado 38r1b

amazônia 245k3y

Notícias

Onda de apoio a Marina Silva após ataques sofridos no Senado une ministras, governadoras e sociedade civil 9106o

Notícias

Em audiência tensa no Senado, PL-bomba e Foz do Amazonas dominam a pauta 3k1x1u

Notícias

Brasil tem 34 espécies de primatas ameaçadas de extinção d7343

Colunas

No jogo das apostas, quais influenciadores apostarão na Amazônia? 22263e

queimadas 3f732f

Notícias

Perda global de florestas atinge recorde em 2024, mostra estudo da WRI 3l3w55

Notícias

Governo confirma mobilização de 4.600 brigadistas para combate ao fogo no Brasil em 2025 4o1a4s

Notícias

Governo se antecipa e decreta estado de emergência em áreas vulneráveis a queimadas 5j5z1s

Notícias

Mesmo com queda no desmatamento, fogo no entorno da BR-319 continua aumentando 4w5q45

Deixe uma respostaCancelar resposta 2s56o

Este site utiliza o Akismet para reduzir spam. Saiba como seus dados em comentários são processados.