Reportagens

ANA muda de pasta e atribuição, mas incertezas continuam 3n344u

Recém-criado Ministério do Desenvolvimento Regional ou a abrigar a Água Nacional de Águas (ANA), que deve assumir questões regulatórias

Emanuel Alencar ·
10 de abril de 2019 · 6 anos atrás
Represa Billings, um dos maiores e mais importantes reservatórios de água da Região Metropolitana de São Paulo. Foto: Wikipédia.

Discutida há pelo menos dois anos, a saída do Sistema Nacional de Recursos Hídricos do Ministério do Meio Ambiente se concretizou no governo Bolsonaro. O recém-criado Ministério do Desenvolvimento Regional (MDR) ou a abrigar a Água Nacional de Águas (ANA), que deve assumir questões regulatórias, abrangendo o saneamento e seus ciclos econômicos. Ainda não está claro, porém, de que maneira essa nova configuração efetivamente funcionará. Há resistências, embates, discordâncias. ((o))eco apurou que o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, tentou manter a ANA, mas acabou sendo voto vencido.

Diretor-Presidente da ANA de 2010 a janeiro de 2018, Vicente Andreu, discorda da medida e enxerga mais uma prática que denota esvaziamento do Ministério do Meio Ambiente.

“Vai na linha do desmonte do MMA e representa uma mudança na concepção sobre a água, que deixa de ser um recurso natural e com visão ambiental e a a ter visão utilitarista do recurso hídrico. E isso pode gerar conflitos dentro da própria ANA”, ressalta Andreu, para quem a visão dos líderes do governo do PSL remonta às décadas de 70 e 80. “O grande problema das nossas cidades é ausência de tratamento de esgoto. Quando você junta gestão das águas com saneamento, com quem fica a prioridade? Tenho quase certeza de que haverá frouxidão na autorização de lançamento de efluentes. A visão de que a natureza a tudo parece ter voltado com força”, observa.

Para Vicente Andreu, a transferência da ANA para o MDR precisaria ter sido debatida com a sociedade:

“Não teve qualquer discussão com comitês de bacias, nada”.

Pequenos municípios serão entregues às moscas, diz ABES

Enquanto o Rio sofria com um terrível temporal na tarde de terça-feira (09), uma audiência pública no Senado discutia a Medida Provisória 868, que versa sobre o novo marco regulatório do saneamento. O texto é uma versão atualizada – e quase idêntica – da redação da MP 844, editada quase no apagar das luzes do governo Temer, no dia da eliminação do Brasil na Copa da Rússia e sem discussão com a sociedade.

Ex-presidente da Agência Nacional de Águas, Vicente Andreu disse que a transferência da ANA para o MDR não foi debatida com a sociedade. Foto: EBC.

O superintendente-adjunto de apoio ao Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos da ANA, Carlos Motta, ressaltou que o governo federal está disposto a ajudar a alavancar o saneamento. Adotou um discurso conciliador e negou que a ANA vá concentrar as decisões ou adotar medidas autoritárias:

“(A agência) ficará responsável por normas de referência nacionais, com o objetivo de ajudar um sistema como um todo. A ANA vai discutir modelos tarifários? Pode discutir. Mas aplicação, cálculo e atribuição serão locais (prefeituras). A gente acredita que a ANA tem condições de contribuir para que o sistema avance”.

Uma das críticas mais contundentes à MP veio de Roberval Souza, presidente da Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental (ABES). Ao criticar o novo modelo defendido pelo governo, ele lembrou que Manaus, ao optar por conceder o saneamento da capital a uma concessionária, em 2000, acabou se beneficiando com avanços no tratamento de esgotos. Os outros 61 municípios do Amazonas, atendidos por uma estatal, entretanto, acabaram por registrar queda no índice de tratamento de esgotos.

“Com esse modelo nós não vamos universalizar o saneamento. O que está no texto da MP vai levar o Brasil a ter seus grandes municípios resolvidos (em água e esgoto) e os pequenos entregues às moscas. Os governos federais e locais vão efetivamente investir nessas cidades?”, questionou.

Segundo a exposição de motivos anexada à MP, o Brasil “não pode conviver com 35 milhões de brasileiros sem o a água de qualidade, 104 milhões sem esgoto tratado adequadamente, num país considerado a 9ª economia do mundo e subjugada a 123º no ranking mundial de serviços públicos de saneamento ambiental”.

País precisa investir R$ 22 bilhões por ano até 2033 para universalizar a cobertura de água e esgoto. Foto: Valter Campanato/Agência Brasil.

Um ponto parece ser pacífico entre governo e oposição: o país que necessita, com urgência, pisar no acelerador em saneamento. Segundo o governo, serão necessários investimentos que superam R$ 22 bilhões por ano até 2033 para universalizar a cobertura de água e esgoto em todo o seu território e evitar a morte prematura de mais de 15 mil pessoas por ano por doenças de veiculação hídrica ou causadas pela ausência de saneamento.

((o))eco tentou falar com o deputado Enrico Misasi (PV-SP), coordenador da Frente Parlamentar Pelo Saneamento, mas não teve resposta.

Em janeiro de 2018, Christianne Dias Ferreira assumiu a presidência da ANA, substituindo Vicente Andreu. No meio acadêmico, ela é professora de Direito Privado e professora assistente do Núcleo de Prática Jurídica do Centro Universitário de Brasília (UniCEUB) deste 2010. Christianne foi indicada a Temer por Gustavo do Vale Rocha, subchefe para Assuntos Jurídicos (SAJ) da Casa Civil. Rocha foi advogado do ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha, que está preso em Curitiba (PR). Os mandatos na ANA são de quatro anos.

 

Leia Também 

Agência Nacional de Águas vai para o Ministério do Desenvolvimento Regional

Diluição não é solução

Trinta e cinco milhões de brasileiros não têm o a água potável

 

  • Emanuel Alencar m18t

    Jornalista e mestre em Engenharia Ambiental. É autor do livro “Baía de Guanabara – Descaso e Resistência” (Mórula Editorial) e assessor de Comunicação na Prefeitura do Rio

Leia também 1b437

Salada Verde
19 de abril de 2018

Trinta e cinco milhões de brasileiros não têm o a água potável 473y4v

Quase metade da população brasileira vive sem coleta de esgoto. Em 2016, somente 45% dos esgotos gerados no país foram tratados, afirma relatório do Instituto Trata Brasil

Colunas
8 de abril de 2005

Diluição não é solução 2f334o

Especialistas do mundo todo discutiram em seminário no Rio o descarte de resíduos no mar. Mas o lixo involuntário não foi contado. E ficou por isso mesmo

Notícias
2 de janeiro de 2019

Agência Nacional de Águas vai para o Ministério do Desenvolvimento Regional 141t3t

Criado a partir da fusão dos Ministérios das Cidades e da Integração Nacional, pasta ficará responsável pela política nacional de recursos hídricos

Mais de ((o))eco 386al

mma 725a64

Reportagens

Orçamento para meio ambiente é 11 vezes menor que recurso destinado a emendas parlamentares 3t2yl

Salada Verde

Vida selvagem e meta para zerar desmatamento são prejudicadas por ataques às unidades de conservação 4sr4h

Salada Verde

Consulta para plano de prevenção da Mata Atlântica termina na próxima segunda 8l15

Salada Verde

Em entrevista, Marina Silva fala sobre recuperar legislação ambiental 21696v

ana 72c2q

Notícias

Clima, povos indígenas e tradicionais priorizados em conferência ambiental 5v204q

Notícias

Nível do rio Paraguai bate novo recorde negativo e atinge -70cm em Ladário (MS) 423g1r

Notícias

Mudanças climáticas devem agravar secas, colocando em risco a oferta de água 6f7335

Salada Verde

Gincana interativa tem como foco a conservação das águas  1x1k2r

saneamento básico 6n5t4i

Análises

Direito ao saneamento básico: um dos pilares da saúde e de uma cidade sustentável 52544p

Notícias

Debatedores frisam necessidade de integração entre gestão de resíduos sólidos e saneamento 292s5v

Salada Verde

Niterói (RJ) ganha prêmio por avanços no saneamento básico 435y1b

Salada Verde

Lula veta ida da Política Nacional de Recursos Hídricos para o MIDR 3p5s48

100 dias 1b446w

Reportagens

Do desmonte à reconstrução, a agenda ambiental em cem dias do governo Lula 711e1a

Reportagens

Governo institui anistia prévia a criminosos ambientais 1f261v

Reportagens

“Revogaço” extingue órgãos colegiados do Ministério do Meio Ambiente 51695l

Análises

Em cem dias de governo, um século de retrocesso na política indigenista brasileira 4kz24

Deixe uma respostaCancelar resposta 2s56o

Este site utiliza o Akismet para reduzir spam. Saiba como seus dados em comentários são processados.

Comentários 3 5w2h3b

  1. Ronaldo Webster diz:

    É facil colocar na reportagem só opinião de um lado. E ainda por cima do ex-diretor de outra linha política. Aí fica tranquilo fazer reportagem no estilo Globo chamando somente seus "especialistas".


    1. emanuelalencar diz:

      Prezado Ronaldo, obrigado por seu comentário. Só para esclarecer que eu procurei a ANA, tendo inclusive falado com sua assessora de imprensa (dia 09/04) e por telefone com o presidente em exercício, Ney Maranhão. Infelizmente não obtive respostas.


      1. Ronaldo Webster diz:

        Mas por que não está no texto essa informação? Só citou que procurou o deputado do PV.